sábado, 26 de novembro de 2011

Sensibilidade Inteligente

Pessoas que às vezes querem me elogiar chamam-me de inteligente. E ficam surpreendidas quando digo que ser inteligente não é meu ponto forte e que sou tão inteligente quanto qualquer pessoa. Pensam inclusive que estou sendo modesta.

É claro que tenho alguma inteligência: meus estudos o provaram, e varias situações das quais me saí por meio da inteligência tambem provaram. Além do que posso, como muitos, ler e entender alguns textos considerados difíceis.
Mas, muitas vezes a minha chamada inteligência é tão pouca... como se eu tivesse a mente cega. As pessoas que falam de minha inteligência estão na verdade confundindo inteligência com o que chamarei agora de sensibilidade inteligente. Esta, sim, várias vezes tive ou tenho.
 
E, apesar de admirar a inteligência pura, acho mais importante, para viver e entender os outros, essa sensibilidade inteligente. Inteligentes são quase que a maioria das pessoas que eu conheço. E sensíveis tambem, capazes e sentir e de se comover. O que, suponho eu, eu uso quando escrevo, e nas minhas relações com os amigos, é esse tipo de sensibilidade. Uso-a mesmo em ligeiros contatos com pessoas, cuja atmosfera tantas vezes capto imediatamente.
Suponho que este tipo de sensibilidade, uma que não só se comove como, por assim dizer, pensa sem ser com a cabeça, suponho que seja um dom. E, com um dom, pode ser abafado pela falta de uso ou aperfeiçoar-se com o uso. Tenho uma amiga, por exemplo, que além de inteligente, tem o dom da sensibilidade inteligente, e , por profissão, usa constantemente este dom. O resultado então é que ela tem o que eu chamaria de coração inteligente em tão alto grau que a guia e guia os outros como um verdadeiro radar.

Clarice Lispector, texto escrito em 2/11/1968

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